À ESPERA DE MARIA
             Confissões de uma mãe adotante. 
                                                           
                              Maria Veridiana Campos
                                Paulo Afonso Ronca

                                                           
A fecundação.
 Hoje, 14 de julho, faço aniversário, 38 anos! Depois do bolo e do parabéns a você, minha mãe me deu um longo abraço. Senti algo muito estranho, um frio na espinha.  Naquela hora, perguntei-me: nunca poderei dar um abraço assim em uma filha? Não, respondi.
         Aquela pergunta continuou a me incomodar e a me aborrecer. Eu não posso ter uma filha. Tê-la, com quem? Não há esse quem. Transar por transar? Não. Ir ao banco de esperma? Não. Pedir uma barriga de aluguel? Não. Adotar? Nunca!
        Trabalho em uma escola estadual e temos lá algumas crianças de abrigo. Em uma sexta-feira de chuva, a funcionária foi buscá-los e levou no colo um bebê. Fiquei encantada com aquele pacotinho rosa e logo perguntei se era dela. Era do abrigo, pois sim, chamava-se Maria e estava para adoção. Passei dias e noites pensando naquela pequenina sem uma família. Quis levá-la para casa. Os olhinhos me olhando não me saiam da cabeça; tive a certeza de que a minha família precisava de mais uma Maria. A minha.
 Pirei da cabeça. Foram meses de muitas resoluções. Você se lembra: o abraço de minha mãe; a pequena menina Maria, seus olhos nos meus olhos. Tudo me levou a uma pergunta existencial: por que adotar uma criança? Mudei a proposta: por que não adotar?  Sim, exatamente, vou adotar! Seu nome? Maria, ora pois! Ponto de exclamação incrédulo. Demorou.   
                                         
Entre inseguranças, eu caminhava.
Demorou, contudo, fui em busca. Estava com todos os documentos solicitados. Um monte, uma pilha de quase metro. Com eles, foi junto meu coração apertado entre a felicidade e o medo do que viria pela frente. Após a entrega, adormecia em mim uma certa segurança de pensar que, a qualquer momento, eu poderia desistir, já que não era uma gravidez biológica. Ela não estava dentro de mim. Não estava ? Nada, qual o quê? Sim, já a sentia se mexer...
O Fórum era gelado, escuro, onde andavam pessoas de todos os tipos e idades. Vi um casal com uma criança no colo. Quando terei a minha Maria?
Desenvolvia-se em mim um furacão de emoções: medo, angústia, paz, paixão e ansiedade e ansiedade e ansiedade [um monstro indesejado que ataca rasgando o peito].
A mulher negra do balcão me desejou felicidades; senti minha filha se mexer em mim. Pura ilusão, pois, quando cheguei em casa, menstruei. Assustada, vi que Maria não estava lá mesmo. Também, lá não era o seu lugar; outrossim, bem apertadinha, ela estava dentro do meu coração...

O caminho para o resultado positivo
Fiz um curso de 3h com uma amável juíza que explicou detalhadamente tudo o que viria pela frente. De alguma maneira aquelas palavras me deram esperança de que realmente eu seria mãe. Em mim, uma estranha sensação de uma mulher que iria parir sem gestação. Que coisa incrível; é outra espécie de natureza.
     A visita da assistente social e os encontros com os grupos de apoio (obrigatórios), foram os seriíssimos impactos no processo. Aos poucos, estava sendo aprovada e já poderia ser habilitada. Maria crescia...

A certeza de que não haveria volta
Em algum momento, o qual não me é possível definir, nasceu a certeza de que eu já estava ligada a uma criança e não desistiria dela jamais.
Durante 25 horas estive com uma psicóloga. Foram tempos de agonia e de dúvidas; tinha de decidir uma questão injusta, a saber: o perfil da criança que nasceria para mim. Branca? Negra? Mestiça? Japonesa? De que idade? De 0 a 12 anos? Poderia ser uma que tivesse alguma deficiência física ou mental? Teria de ser totalmente sincera ou dizer o que talvez a psicóloga desejasse ouvir?  
Ter de dizer ‘não’ para alguns e ‘sim’ para outros tipos de crianças foi, sem dúvidas, o pior e crucial momento até aqui. Escolhi uma criança de 0 a 12 meses, de qualquer raça e com doenças tratáveis. Assim é que se deve fazer; são as regras do jogo. Confesso, eram as dores de um parto que demoraria dias, semanas, meses, anos. Leitora, queria ver você no meu lugar.

A habilitação
Maria tomava forma. Desenvolvia-se.
Eu corria como uma louca em busca da sonhada ‘habilitação’ para adotar. Depois de 11 meses de um longuíssimo processo, ela me foi confiada; o Estado me conferia o poder e a possibilidade de ser mãe. Senti-me totalmente perdida. Fazer o quê, agora? Quando não se pode responder a esta pergunta, é melhor não fazer nada. Assim, continuei na espera.

O enxoval
Na espera, qual nada. Fui ao enxoval. Que momento afável, quase delicioso. Os vestidinhos, os sapatinhos, o berço, as mamadeiras, o trocador, as fraldas, o perfuminho, o shampoo, a chupeta, a cadeirinha para o carro. Deus, quanta coisa é preciso! Não medi esforços, dinheiro ou tempo. Enfim, será que não esqueci nada? Sim, esqueci-me de dizer-lhe que, com o enxoval pronto, a ansiedade aumentava. Todos me ordenavam calma. Eu, a mim, também. Só que o meu corpo já não mais obedecia às ordens de minha mente.   
Maria já fazia parte de minha existência. Ela não sairá de mim, todavia vai entrar em mim. Não sei como, onde ou quando ela chegará, mas já é minha filha e a cada dia que passa sinto que damos mais um passo, uma em direção a outra.

 O tempo não passa
         Não há como anular o tempo. Ele é o Senhor da razão. Um excelente professor, mas um odiento e indelicado amigo. Não se pode torcer o tempo como se deseja; é mais fácil ele nos amoldar. 
Maria está para chegar. Hoje, amanhã, daqui dois ou três meses? Não sei. Só uma coisa eu penso: esta experiência existencial pela qual passo é absurdamente inominável. Não há como descrevê-la. A vida vai me presentear com uma filha; quanta responsabilidade! Quando ela chegar, eu a apresentarei a você.
Você tem paciência? Pois, então, espere comigo e com Maria. Ela, em algum lugar deste mundo também está esperando por mim.     




     

Comentários

  1. Parabéns Veri pelo amor que cresce a cada dia mais e mais em você, a decisão da adoção e muito admirável,que Deus a abençoe cada dia mais e diminua á espera dava da chegada da Maria

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    1. Maria Veridiana Neves Marcos Campos19 de junho de 2018 às 17:04

      Obrigada Ju ...muito amor e muita ansiedade....seguimos juntas...bjs

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  2. Veri, te desejo toda boa sorte que esta vida possa te oferecer...que venha a MARIA...

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  3. Veri... já consigo sentir vc brincando, pulando, fazendo farra com a Maria. Durante um soninho, envolta em seus braços, fazendo uma manhinha. A Maria está tão presente em sua vida que pra mim é difícil acreditar que ela não está aí bem do seu ladinho.

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  4. Ela ta chegando....

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  5. "Nada é por acaso"
    NO MOMENTO QUE VC VIU seu pacotinho de luz cor rosa, brilhou o amor e esse é seu caminho certo.
    Uma filha que lhe dará muitas lágrimas de alegria...é sua missão e a dela tb....acredito muito nisso.
    Eu aqui longe de vc, em outro estado agora, torço infinitamente pela felicidade de sua filha e sua...
    Na espera tb, com alegria, desse dia tão esperado.
    Bjs no seu enorme coração
    ❤❤������

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  6. Muito obrigada pelo carinho Márcia. .bjs

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  7. Que lindo Veridiana! Logo sua pequena estará em seus braços e vcs serão muito felizes! A Maria já está a caminho e o encontro de vcs já estava marcado...bjo pra vc e sua família linda!!!

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    1. Obrigada Luciana....logo vcs vão ve-la aqui comigo...bjs

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  8. Que lindo Veridiana! Logo sua pequena estará em seus braços e vcs serão muito felizes! A Maria já está a caminho e o encontro de vcs já estava marcado...bjo pra vc e sua família linda!!!

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  9. Não conseguimos postar no seu blog
    Nossa amada Veridiana felizes estamos com sua decisão e sabemos o quanto Maria já é amada sabemos porque recebemos muito amor de vocês.
    E saiba que o dia certo Jesus já tem marcado oramos por vocês e sabemos que Deus está no controle de tudo!
    Venha Maria
    Venha Maria
    Esperada amada
    Wagner Angela
    Amamos vocês

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  10. Estou emocionada com seu depoimento, Veri. Quando Maria chegar um sonho se realizará, de uma mãe linda que tem muito amor para dar.

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    1. Obrigada Silvana ....será um sonho mesmo !!

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  11. Estou emocionada com seu depoimento, Veri. Quando Maria chegar um sonho se realizará, de uma mãe linda que tem muito amor para dar.

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  12. Que lindo Veri. Que a Maria chegue rapidinho,com muita saúde, cheia de luz e abençoada por Deus.Vocês serão muito felizes.
    Beijos no seu coração.

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  13. Lindo texto! Ahh, como te entendo! Sempre quis ser mãe, mas esperei sempre ter as condições certas e a idade chegou e o parceiro não! Até que reencontrei um ex da adolescência, hoje meu marido e tentamos por quase 4 anos e nossa bebê não veio! estou entrando na 10ª semana de gestação (adoção) conto assim, e hoje recebemos o comunicado que temos uma intimação por causa da adoção, ahh meus coração saltitou de esperanças... e assim vamos seguindo... Vc feliz e radiante e nós aqui esperançosos pela chegada de nossas filhas... que venham logo nos abraçar, sabe pq? Pq em algum lugar elas já estão nos esperando. Bjss

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    1. Tenho certeza que muito em breve estaremos com nossas meninas no colo....a espera é muito dolorosa mas um dia ela acaba...obrigada pelo comentário....bjs

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